sexta-feira, agosto 05, 2005 |
Comunicação Afectiva / Interacção Emocional no Processo Grupanalític |
Comunicação Afectiva / Interacção Emocional no Processo Grupanalítico
Resumo A presente comunicação pretende fazer uma abordar teórica sobre a importância da Comunicação Afectiva /Interacção Emocional nos fenómenos psicodinâmicos em Ambiente Grupanalítico (na Matriz Grupal, nos Processos Transferencial e Contra - Transferencial, na Ressonância Emocional, nos Momentos de Encontro, nos Processos de Identificação, etc.) e as suas implicações teóricas, tendo em conta, os mais recentes dados da investigação em Neuro-Ciências dos Afectos e as reformulações teóricas da Psicanálise do Desenvolvimento.
Palavras Chaves: Comunicação Emocional, Emoções, Grupanálise, Psicanálise do Desenvolvimento, Vinculação
Preâmbulo O presente trabalho pretende abrir uma reflexão sobre a importância da comunicação afectiva/emocional nos processos terapêuticos analíticos, em particular, em Grupanálise, tendo em conta, os recentes aportes teóricos e clínicos, provindos de diferentes áreas da investigação, da Psicanálise do Desenvolvimento e das Neuro-Ciências dos Afectos. Todos nós sabemos que os processos afectivo-emocionais são, na sua maioria, inconscientes e referem-se essencialmente, aos aspectos não-verbais da comunicação humana. Trata-se de um assunto de grande actualidade, o qual esteve sempre presente na mente dos teóricos do Movimento Grupanalítico, mas ele nunca foi tema de uma reflexão sistematizada. Como o Processo da Comunicação Afectiva/Emocional têm sido pensado pelos Autores Grupanalíticos? Para já, a comunicação, per si, surge como um dos três processos dinâmicos básicos em Grupanálise, a par da relação e da configuração e na sua descrição surge desde logo, a componente afectivo/emocional, quando Cruz Filipe (1969) escreve: “a comunicação é um processo essencialmente dinâmico por meio do qual se dão as trocas de afectos, pensamentos e necessidades com os Outros.... É imensamente variável – série de processos conscientes e inconscientes, - comunicação verbal, sintomas. Entre ambos estão todas as formas de comunicação não verbal”... ou Ponciano Ribeiro (1981) quando se lhe refere como “algo que acontece para além dos limites da palavra” ou “a palavra vestida de sentimento é comunicação”... Já em 1953, Foulkes já dava muita importância à comunicação afectiva, quando ele se referiu que: “nas comunicações de cada membro do grupo existe sempre um nível subjacente de cariz afectivo ou emocional, pois às comunicações de cada pessoa vão as outras responder de modo instintivo e inconsciente” ou quando ele clarifica um pouco melhor esta questão, em 1975, ao afirmar que: “cada um dos membros do grupo comunica de acordo com a sua ressonância (afectiva) particular correspondendo à sua própria psicopatologia ou à sua relação particular para com aquela pessoa ou para a inferência implicada naquele mesmo momento”... Este mesmo autor (Foulkes,1964/1968) atribuía um papel fundamental aos Afectos nos processos da comunicação em grupo, considerando estarem eles profundamente ligados aos factores terapêuticos específicos da situação grupanalítica. Questão que foi também realçada por Malcolm Pines (1983), no seu livro “The Evolution of Group- Analysis”. Nos factores terapêuticos (a socialização, os fenómenos de espelho e da simbolização e a partilha ou troca) estariam presentes dimensões afectivas. Por exemplo, na partilha não haveria somente uma troca informações, mas também de vivências (afectivas), “as quais permitiriam a compreensão, em cada um dos membros, dos significados das interacções e dos problemas emocionais em discussão”... Malcolm Pines (1983) acrescentaria que: “isto também poderia levar ao desencadeamento de “fenómenos em cadeia e à ressonância afectiva”. Ponciano Ribeiro (1981) relembra-nos que entre os agentes dinâmicos facilitadores da mudança psicológica, “a experiência emocional correctora constitui a capacidade de revivênciar no aqui e agora do grupo, os acontecimentos traumatizantes passados, sem os conflitos e censuras passadas” e que “esta re-experiência emocional no aqui e agora do grupo poderá, de facto, fazer com que alguém sinta a significação real do seu problema”...
Em Portugal, Mendes Leal, citada por Cruz Filipe (1969) “postulava que o valor terapêutico do processo grupanalítico, passava pelas re-experimentações das emoções (pulsões procurando descarregar-se) num grupo actual analítico e pela sua re-experimentação dentro duma rede de grupo”. A estes aspectos dos processos de comunicação em grupo, Eduardo Luís Cortesão designou-os, em 1989, de “fenomenologia do processo grupanalítico”. Num artigo publicado recentemente, César Vieira Dinis (Dinis, 2000) volta a chamar à atenção de que a Comunicação sempre esteve no cerne da conceptualização grupanalítica conforme, ele ressalta exemplarmente, se considerarmos a definição de “matriz” do grupo, conceito nuclear na teoria e praxis grupanalíticas. Este autor reportando-se ao entendimento de matriz em Foulkes (1967), como a “teia hipotética de comunicação e relação num dado grupo” e a Cortesão (1989) que a ampliou para a “rede específica de comunicação, relação e elaboração”, Vieira Dinis, em 1994, acrescenta à definição de matriz, o aspecto de rede de transação emocional, pois para ele: “na situação grupanalítica... estabelecem-se gradualmente inter membros canais de comunicação e transações relacionais carregadas de teor afectivo” e lhe parecia que: “estas transacções emocionais contemplam no essencial, o que se entende por vínculo, na dimensão inter-subjectiva, enquanto estruturas agregando pessoas”. Portanto a compreensão de uma parte importante do nosso trabalho, passa pelo nosso entendimento, como os aspectos afectivos dos mecanismos inconscientes presentes na matriz grupanalítica, tais como, a empatia, a identificação,a projecção, a transferência ou a contra-transferência, se desenrolam nas mentes dos pacientes e do terapeuta, em torno dos fenómenos relacionais em grupo. Vamos agora abordar, a questão dos afectos e da emocionalidade na estruturação psíquica da Mente, partindo da compreensão de alguns modelos teórico-clínicos recentes, de diferentes áreas de investigação os quais podem ser heurísticamente muito úteis para todos nós, ajudando-nos a pensar por novos caminhos clinicamente úteis e a estender as nossas linhas de raciocínio nestas áreas. Os Aportes da Psicologia do Desenvolvimento e das Neurociências Nos últimos anos, estudos clínicos e experimentais em psicologia infantil têm convergido na centralidade das funções afectivas nos primeiros anos de vida. Em paralelo, estudos em neuro-ciências dos afectos têm descrito sistemas estruturais lateralizados à direita, os quais medeiam as funções sócio-emocionais não-conscientes do cérebro descritas pelos Psicanalistas do Desenvolvimento. Num artigo recente, Allan Schore (2003) articulou bastantes dados sobre como a maturação estrutural do cérebro direito é directamente influenciada pelos relacionamentos de vinculação, oferecendo-nos uma oportunidade para compreender a origem, a dinâmica e a estrutura dos conteúdos inconscientes da Mente. Segundo ele, os actuais modelos psico-neuro-biológicos indicam que o núcleo do inconsciente é um núcleo afectivo psico-biológico (Schore, 1994), já descrito por Emde (1983) quando este identificou a estrutura integrada e primordial do Self, como tendo um “núcleo afectivo” emergente, aonde se mantêm as imagens do Self e os registos de todas as emoções, cognições e memórias associadas que se formaram durante a infância. De facto, Freud (1915) já tinha deduzido que o sistema inconsciente surge muito cedo na vida, bastante antes das funções verbais conscientes. Actualmente o desenvolvimento humano não pode ser compreendido fora do processamento da informação sócio-emocional e da transação psico-biológica, considerando-se que o desenvolvimento das capacidades de experiênciar, comunicar e regular as emoções são, momentos chaves da nossa infância. Existe um corpo de evidências científicas que indicam que o desenvolvimento destas capacidades é uma experiência dependente de processos maturacionais do hemisfério direito, a que o neuro-cientista Robert Ornstein designou de “mente direita”. Sabe-se que o hemisfério direito matura antes do esquerdo e que o seu crescimento é bastante intenso no primeiro ano e meio de vida e dominante para os 3 primeiros anos (Chiron et al., 1997), um dado, na linha da assunção de Freud de que o processo primário precede ontologicamente às funções dos processos secundários. Sabe-se que as experiências interactivas precoces entre o cérebro e o ambiente social são mediadas pelas comunicações afectivas e pelas transações psico-biológicas e que as influências do meio social são imprimidas nas estruturas biológicas em maturação durante as fases iniciais do crescimento cerebral, através de um impacto directo sobre os sistemas genéticos que programam o crescimento cerebral (Schore, 1994, 2003a, 2003b) e que o meio ambiente social tem poderosos efeitos na estrutura do cérebro, o que está de acordo, com a concepção de Anna Freud (1965) de que a estruturação psíquica resulta por um lado, de sucessivas interacções entre as sequências maturacionais biológica e geneticamente determinadas na criança, por outro, as influências experiênciais e ambientais.
Estas experiências interactivas precoces são, essencialmente, as comunicações sócio-emocionais envoltas num relacionamento de vinculação regulatória dos afectos entre a criança e a sua mãe. Os produtos do crescimento emocional são: a emergência de capacidades cada vez mais complexas de regulação dos afectos, a mudança da regulação externa para uma regulação interna e a obtenção de uma capacidade essencialmente adaptativa para a auto-regulação dos afectos. A neurobiologia do desenvolvimento emocional refere-se a uma “construção social do cérebro humano” (Eisenberg, 1995) que é uma tarefa desde o nascimento e que se desenrola essencialmente no 1º ano da vida do bebé. O recém-nascido utiliza desde logo, as suas capacidades sensórias, em particular, o cheiro, o paladar e o toque, para interagir com o meio social. Aos 2 meses de idade, ocorre o início de um período crítico de maturação do córtex occipital (Yamada et al., 2000), o qual está ligado à visão, que permite uma mudança e progressão dramáticas das suas capacidades sociais e emocionais. A partir de então, a face expressiva e emocional da mãe, passa a ser de longe, o estímulo visual mais potente e a criança começa a revelar um intenso interesse pela face e, em particular, pelos olhos da mãe, seguindo-os no espaço e envolvendo-se ambos, em períodos de intensa fixação mútua. Desde logo, surge um processo de aprendizagem para cada parceiro da díade mãe-filho, da estrutura do Outro e de modificação do seu comportamento no sentido de se ajustarem a este processo se designa de sincronia. Allan Schore (2003) descreve o modo como a mãe intuitiva, sintoniza e ressoa com o estado psico-físico da criança, designando este processo como sincronização afectiva, no qual o bebé é activado (ou desactivado ou hiperactivado) dinamicamente e a mãe corrige a intensidade e a duração da sua estimulação afectiva com a finalidade de manter uma situação positiva na criança. De facto, segundo este autor, a coordenação das respostas é tão rápida, o que lhe sugere a existência de um elo ou vínculo de comunicação inconsciente, numa matriz interactiva promotora da expressão dos afectos internos da criança. A mãe ou o cuidador primário também participam no restabelecimento interactivo da regulação dos estados de tensão induzidos na criança, sendo a tensão, definida como, uma assincronia numa sequência de interacções. seguindo, um período de restabelecimento da sincronia que permite a recuperação da tensão. Havendo um padrão de correspondência entre a disrupção e a reparação do cuidador “suficientemente bom”. De facto a sintonia psicobiológica, a ressonância interactiva, a sincronização mútua e o abarcar dos ritmos psico - biológicos são os processos fisiológicos que medeiam a formação dos elos de vinculação e estes processos regulatórios são precursores da vinculação psicológica e das emoções associadas. Ele conclui que a Vinculação é um processo interno que promove a transferência dos afectos entre mãe e criança, pois a mãe sincroniza e ressoa com os ritmos dos estados internos da criança e regula o nível de estimulação não só minimizando os afectos negativos, mas também a maximização das oportunidades para o afecto positivo. Aliás Stroufe (1996) já considerava que a Vinculação é a regulação diádica (interactiva) da emoção. Alguns dos importantes resultados de uma Vinculação segura são aqueles que estão ligados ao surgimento das sensações internas de segurança e de resiliênçia, baseadas no conhecimento intuitivo de que podemos regular os nossos fluxos afectivos e as mudanças de estados emocionais do nosso corpo e no desenvolvimento de uma função reflexiva, a operação mental que permite a percepção do estado emocional do Outro (Fonagy e Target, 1997). Por oposição, quando se cresce em ambientes perturbadores para a Vinculação e para a formação da Personalidade apresentam-se défices ligados a perturbações da empatia, isto é, capacidades limitadas na percepção dos estados emocionais ou falhas na atribuição dos estados emocionais ou na interpretação das intenções dos outros ou ainda capacidades limitadas para modular a intensidade e duração dos afectos, especialmente os primários, isto é, sob tensão psíquica, não se experiênciam afectos diferenciados ou discretos, mas antes, estados difusos, não-diferenciados e caóticos acompanhados por esmagadoras sensações viscerais e somáticas. A estas capacidades restritas para reflectir sobre os seus estados emocionais, Fonagy e Target (1997) designaram de falta de mentalização. Como as Relações Primárias se tornam internalizadas e se transformam em Estrutura Psíquica? A Teoria Regulatória da Vinculação de Allan Schore (2003a) afirma que: “as interacções face a face estão sincronizadas e sintonizadas psico-biologicamente, no hemisfério direito da criança, o qual é dominante para o reconhecimento da face maternal e para a percepção da estimulação induzida das expressões faciais afectivas, da informação visual emocional e da prosódia da voz da Mãe”... e é “regulada pelos estímulos do cérebro direito da Mãe”, sugerindo que “a Vinculação é, na sua essência, a regulação de sincronismos biológicos dos Cérebros direitos entre organismos”(mãe e filho) e o seu mecanismo de aprendizagem será o “imprinting”.
Estudos neurobiológicos recentes revelaram que é o córtex órbito-frontal, a estrutura que está envolvida “ao mais alto nível no controlo do comportamento, em particular, em relação à emoção” (Price et al., 1996) e que joga “um papel particularmente proeminente na modulação emocional da experiência” (Mesulam, 1985). Esta estrutura é descrita como a região cortical nodal para a junção e monitorização do passado relevante e as actuais experiências, inclusive, as afectivas e os valores sociais” (Cavada e Schultz, 2000) e que está “envolvida em funções humanas críticas, tais como, a adaptação social, o controlo do humor, as pulsões, e a responsabilidade, traços que são cruciais na definição da “personalidade” de um indivíduo” (Cavada e Schultz, 2000). Estas regiões órbito-frontais não são funcionais à nascença, mas entram em funcionamento, no decurso do último trimestre de 1º ano de vida, (Shore, 2003) . Estes sistemas órbito-frontais têm uma função de controlo executivo sobre todo o cérebro direito no qual se pensa “existir um “léxico afectivo não-verbal”, um vocabulário para sinais afectivos não verbais, tais como, expressões faciais, gestos e tonalidades vocais” (Bowers et al.,1993; Snow, 2000). No cérebro direito está sendo associado para além, do processamento emocional, com o processamento dos pensamentos contextual, espacial e global, assim como com a informação não-verbal e sócio-emocional e a integração da informação a partir do corpo. Em apoio ao seu papel, no sincronismo biológico, sabe-se que a actividade do hemisfério direito é instrumental para percepção empática dos estados emocionais dos outros seres humanos (Schore, 1994, 2003). Allan Schore (2003) considera que a regulação interactiva do cérebro direito será possivelmente, o substracto da empatia e no qual se armazena um modelo operativo interno do relacionamento vinculativo, o qual codifica as estratégias da regulação afectiva que mantêm a regulação básica e o afecto positivo mesmo perante as mudanças envolventes (Schore, 1994). Este modelo inconsciente, estará guardado, segundo Fink e colaboradores (1996), nas memórias implícitas procedurais que fazem parte do substracto da memória autobiográfica carregada afectivamente. Será no córtex órbito-frontal, responsável “pelas interacções cognitivo-emocionais”, a área aonde se geram os modelos de trabalho interno que contém as representações dos componentes afectivos e cognitivos que geram linhas não-conscientes que guiam o comportamento antes que o conhecimento consciente ou reflexivo o faça (Bechara etal., 1997) e que codificam a possível significância das opções comportamentais futuras (Dolan, 1999) representando um importante sítio de contacto entre a informação emocional e os mecanismos de selecção da acção (Rolls, 1996). Tudo isto parece estar, de acordo, com a assunção de Bowlby (1981) de que os modelos operativos internos inconscientes são usados como guias para a acção futura. Um outro autor (Brothers,1995) descreveu um circuito límbico a partir do córtex órbito-frontal cuja funções funcionariam como um ““editor” social especializado no processamento das intenções sociais dos outros “através da avaliação dos significados dos gestos e das expressões “ e que “encorajaria o resto do cérebro a relatar sobre acontecimentos do ambiente social”. Este editor agiria como um sistema unitário “especializado para responder a sinais sociais de todo o tipo, um sistema que iria construir, em última instância, “as representações na mente”. Neste córtex órbito-frontal que se encontra maturado, a meio do 2º ano de vida, é aonde se começa a consolidar um núcleo de Self não verbal e inconsciente, apoiado em padrões de regulação afectiva. Este núcleo de Self terá progressivamente a capacidade de corrigir de modo flexível os estados emocionais através das interacções com os outros seres humanos via contextos inter-conectivos (regulação interactiva) ou via contexto autónomo (autoregulação) e com a capacidade de mudar entre estes dois modos regulatórios, dependendo do contexto social. Algumas Implicações para um Modelo Psico-Neurobiológico em Grupanálise Esta série de dados clínico-teóricos apresentados permitem-nos fundamentar a possibilidade de existirem processos neuro-biológicos e psico-biológicos na comunicação afectivo/emocional e na dinâmica relacional dos processos grupanalíticos. Nesta nova perspectiva de compreensão das interacções analíticas em grupo, podemos afirmar que estas são relacionamentos emocionais com origem em processos primários de vinculação, onde as comunicações afectivo/emocionais são essencialmente, sinais sobre a qualidade das relações infantis e que estão ligadas a representações interactivas codificadas nas memórias implícitas-procedurais (Amini et al.,1996). Estes relacionamentos emocionais ocorrem dentro da aliança terapêutica, sendo esta, um contentor e um activador dos afectos e das emoções experiênciados em todos os outros relacionamentos anteriores, com a sua intensidade determinada, pelo grau de vinculação e de intimidade experiênciados no relacionamento terapêutico actual.
Durante a criação da aliança terapêutica, o terapeuta empático e intuitivo deve experiênciar um estado de sintonia vitalizante em relação ao paciente (Schore, 1994, 2003a), isto é, deve existir entre ele e os pacientes, estados de sincronia afectiva não-verbal e de ressonância afectiva não somente para com os estados mentais (cognições), mas também para com os estados psicobiológicos (afectivo-corporais) deles. O terapeuta empático deve estar atento a nível consciente às verbalizações de modo a diagnosticar objectivamente e a racionalizar a sintomatologia de desregulação dos pacientes. Simultaneamente, ele estará em escuta e em interacção num outro nível de experiênciação subjectivo, abaixo do discernimento, onde ele processa a informação sócio-emocional. O terapeuta deverá estar imerso de modo empático e “sintonizado para o fluxo contínuo e para as mudanças nos sentimentos e experiências dos pacientes” como descreveu Kohut (1971) ou em situação de “eventual atenção flutuante”, como afirmava Freud, em 1912, sobre este estado de disponibilidade receptiva ou ainda em situação de “rêverie” ou “estado de sonho (consciência) alfa”, segundo a conceptualização de Bion (1962). Desde o primeiro momento do contacto, o terapeuta deve apreender as estruturas rítmicas não-verbais dos estados internos dos pacientes, modificando o seu comportamento de modo relativamente flexível e fluído, a fim de se sincronizar com tal estrutura, criando assim, um contexto para a organização de uma aliança terapêutica. Esta aliança terapêutica é estruturada numa aprendizagem implícita e procedural (inconsciente) (Hugdhal, 1995, Rolls, 1996), dos processos não-verbais (Schore, 1994) e ligados à emoção (Rolls et al., 1994), a fim de criar um tal “conhecimento relacional implícito” a que Stern e Colaboradores (1998) consideraram estar no “centro da mudança terapêutica” e na “organização de uma nova aprendizagem”. Durante o encontro terapêutico, o analista deverá tomar consciência dos seus estados mentais psico-biológicos e das impressões contra-transferênciais obtidas através das comunicações transferenciais inconscientes dos pacientes. Estas comunicações são expressas nos “momentos afectivos intensificados” quando os modelos internos de funcionamento do paciente são acedidos e assim revelados os modos transferenciais e as estratégias de “coping” da regulação dos afectos dos pacientes (Schore, 2003a). O terapeuta psicobiologicamente sintonizado terá a oportunidade para actuar como um regulador afectivo e interactivo dos estados des-regulados dos pacientes (Schore 2003a), pois uma das suas finalidades, é a promoção da regulação dos afectos. Em relação aos fenómenos da transferência (Wallerstein, 1990) e da contra-transferência (Gabbard,1995), estas podem ser descritas, em termos emocionais, da seguinte maneira: A reacção transferencial, como o aparecimento de emoções deslocadas, envolventes e emergentes que expressam os significados das relações interpessoais da mais afastada infância. Aliás, Freud já tinha constatado que a emoção aparecia repetitivamente na situação de transferência e mantinha-se aí, até ao instante, em que podia ser reconhecida ou assumida. Quando o paciente a aceitava,distanciava-se face à emoção revivida e o discernimento (insight) tornava-se possível e útil. Nas actuais perspectivas psico-neurobiológicas, os fenómenos transferenciais, podem ser encarados, como processos interactivos de regulação emocional, baseados na re-experienciação de momentos emocionais projectados no analista ou nalgum dos participantes do grupo, de conflitos e/ou vivências particulares reportadas à infância de cada um. Estes momentos emocionais transferenciais ocorrem durante momentos de excitação (estimulação) emocional, em que a atenção está alterada e existe “uma elevação da sensitividade para as disposições relacionadas com o estado emocional do momento” (Lane et al., 1999). Em relação ao fenómeno da Identificação, expressão mais precoce da relação afectiva com outra pessoa, a base deste processo consiste essencialmente em certos aspectos de um Ego se transformam por influência de outro Ego. Este fenómeno permite verdadeiras catarses com o desencadear e aflorar de emoções e sentimentos reprimidos durante anos, perante as pessoas significativas do passado, sendo através dos mecanismos da Identificação que os elementos do grupo conseguem expressar, exteriorizar e modificar as emoções e sentimentos ou os seus padrões primitivos de conduta os quais se tornam disponíveis para a clarificação através da interpretação do grupanalista. Quanto à Interpretação, esta deve ser feita sobretudo em momentos de transferência positiva ou em momentos vivênciais profundos do grupo, quando o Grupanalista tenta fazer uma regulação emocional correctiva, colocando,às claras, os processos de resistência (situações de des-regulação emocional) e os mecanismos de defesa (reacções ao stress emocional) que estão a ser despoletados pelas vivências emocionais do momento transferencial. Da parte do terapeuta, as Interpretações mais efectivas devem estar baseadas, segundo Boyer (1990), no “discernimento das suas próprias respostas físicas, emocionais e ideacionais às mensagens veladas do paciente” e da parte dos pacientes, os “entendimentos mais adequados” ocorrem quando eles sentem o analista sintonizado para o seu estado psico-biológico, no momento em que a interpretação é oferecida.
Num “diálogo genuíno” com o terapeuta, os pacientes levantam a partir dos mundos internos e depois em palavra falada, o que eles necessitam dizer num momento particular mas que eles ainda não possuem como discurso. Os pacientes precisam de experiênciar esta descrição verbal dos seus estados internos, como ouvidos e sentidos por um Outro empático. Desta maneira, os aspectos emocionalmente responsivos das intervenções do terapeuta são transformadores, isto é, tornar “os sentimentos crus em símbolos”, o que permite, segundo Holmes (1993), uma conecção entre dois domínios representacionais, o não-verbal implícito e o verbal explícito. De acordo, com Stolorow e Atwood (1992), iria facilitar a “evolução dos afectos a partir da sua forma primitiva, na qual eles eram experienciados como sensações corporais, em estados subjectivos que podem ser gradualmente articulados verbalmente”. Os mecanismos essenciais que regulam, em tempo real, as conecções, disconecções e re-conecções dos mundos internos dos pacientes e do terapeuta são mediados pelas transacções da transferência – contra – transferência nãoverbais. Enfim o processo grupanalítico pode ser um meio para o desenvolvimento afectivo do adulto que serve o propósito da reflexão consciente sobre os seus processos afectivos, permitindo o desenvolvimento de uma “parte pensante do cérebro emocional” (Goleman,1995) ou “de uma agência organizadora e auto-reflexiva da mente” (Karen Kaplan-Solms e Mark Solms,2000), com a finalidade de “integrar e atribuir os significados emocionais e motivacionais às impressões cognitivas ou fazer a associação da emoção com as ideias e os pensamentos” (Joseph, 1996), cujo papel é o de elaborar o conhecimento reflexivo do Self, o qual permite às pessoas reflectirem sobre os seus estados emocionais, assim como, os dos Outros. Para terminar esta reflexão ainda incompleta sobre a Comunicação Afectivo/emocional em Grupanálise, o autor gostava de realçar que esta questão também passa pela compreensão da intersubjectividade relacional inscrita na matriz grupal apoiada no exercício das nossas capacidades empáticas e no facto de ter de estarmos atentos às nossas intuições sobre tudo aquilo que os nossos analisandos nos suscitam dentro dos relacionamentos íntimos que aí se desenrolam.
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posted by Mikasmokas @ 8/05/2005 |
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1 Comments: |
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Muito interessante. Agradeço!
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Muito interessante. Agradeço!