Histórias de portugueses que assumem o fim da exclusividade e vivem relações abertas com vários parceiros. Sem fidelidade e sem enganos
Lara e Jorge estão juntos há 12 anos. Logo no início da relação, descobriram que não sentem ciúmes e que ficavam felizes por ter outros relacionamentos. Alex tem uma namorada há oito meses e, embora não ande à procura de outros relacionamentos, não exclui essa possibilidade. Michael vive sozinho, mas mantém, actualmente, três relações. Ana vive com o companheiro e tem duas namoradas, uma delas deverá ir viver com o casal e formar um "V" aberto.
"Se um pai tem um filho e, depois, nasce um segundo filho, o amor que tinha pelo primeiro não fica diminuído. E se nascer um terceiro filho, o pai vai amar os três, sem que o amor por cada um diminua. Nós somos capazes de amar várias pessoas em simultâneo, sem que isso signifique dividir o amor", defende Lara. Jorge, o companheiro, concorda: "Há menos stresse na relação porque não há a pressão de sermos tudo para a outra pessoa".
Lara e Jorge são predominantemente heterossexuais, embora ambos já tenham tido experiências com pessoas do mesmo sexo.
Família alargada e aberta
As várias relações que mantêm não colocam em causa a sua união e gostariam de alargar a família a outros elementos. Foi o que aconteceu, durante algum tempo, com outro casal. Viviam em casas próximas e partilhavam as suas vidas e as suas camas, mas uma mudança de cidade ditou o afastamento. "A situação ideal era que mais pessoas entrassem para a nossa família e que partilhássemos tudo, sexo incluído", sublinha Jorge. O casal gostaria de ter filhos e de os educar no seio desse modelo de família alargada.
Alex considera que "não há satisfação plena com uma pessoa", pelo que está sempre aberto à possibilidade de ter várias relações em simultâneo. "Cada pessoa desperta uma faceta diferente", explica este brasileiro de 31 anos a residir em Portugal há sete. "Se tudo na Natureza é cíclico, porque há-de o amor ser eterno?", questiona.
Ana percebeu muito cedo que era capaz de amar várias pessoas ao mesmo tempo. Mais: que ficava feliz se o companheiro também o fizesse. Essa descoberta permitiu que ambos aprofundassem uma vivência que sai dos parâmetros da tradicional exclusividade monogâmica, mas que, aparentemente, resulta: estão juntos há 15 anos. E até resistiu a uma revelação que poderia ser fatal para um casal convencional - ela descobriu que, afinal, é lésbica.
Sexo não define relação
Os rótulos são manifestamente estreitos para compreender um estilo de vida que desafia algumas das mais enraizadas tradições da nossa sociedade. Ela sente-se lésbica, mas não prescinde da sua relação com Miguel, porque considera que não é o sexo ou a atracção e intimidade físicas que definem uma relação. Diz que é o "desejo e a capacidade de fazer planos em comum, a longo prazo" que caracterizam uma relação.
E é uma relação que tem com Miguel, que considera seu companheiro, não obstante ser lésbica. Ele, por seu lado, também mantém relações com outras mulheres, algumas das quais também já se relacionaram, de forma íntima, com Ana, mas tal "não é obrigatório".
De casal para "V" aberto
Miguel também já partilhou as parceiras de Ana. O que não acontece agora. Ela tem duas namoradas. Uma delas vai mudar-se lá para casa e constituir um "V" (relação em que apenas um dos elementos se relaciona intimamente com os outros dois). Um "V" aberto, o que significa que todos têm liberdade de se relacionarem com outros parceiros exteriores à constelação. Ana, Miguel e outra mulher já viveram num "V" fechado ou em polifidelidade (fiéis entre si), mas este modelo não colhe as preferências do casal.
Confuso? A rede pode ainda ser mais complexa. O limite é o tempo. "O meu coração é elástico, mas o tempo não. Por isso, não começo relações de que depois não posso cuidar", sublinha esta activista de poliamor ou da não monogamia responsável, como prefere designar. Na sua opinião, a prática consentida de relações múltiplas e simultâneas "retira o peso excessivo do sexo numa relação". "Podemos ter uma pessoa com quem nos queremos relacionar para o resto da vida, mas o sexo não é bom. Se for possível ter sexo com outra pessoa, com total honestidade e sem magoar ninguém, é muito melhor", garante.
Embora encarado sem tabus, o sexo não define as relações, muito menos os sentimentos. Michael confessa ainda amar duas das mulheres com quem se relacionou no passado. Uma delas é mãe de um dos seus filhos e uma das suas melhores amigas. "Amo-a e não temos sexo há muitos anos." Noutros casos, a relação passa pela cama. Actualmente, relaciona-se de forma íntima com três mulheres - todas sabem que não são exclusivas. Afirma que sente amor por todas, mas assume que o sentimento não é igual, porque o "amor constrói-se, solidifica-se com o tempo".
Gestão dos ciúmes
Mesmo assumindo que o amor não se divide, antes multiplica-se, a questão dos ciúmes não é fácil de gerir. Ana assume-os, mas entende que são uma manifestação do medo de se perder o outro e não um sinal de posse. "Consegui desconstruir o sentimento de posse associado ao ciúme e percebi que, no meu caso, significa o medo de perder, que surge quando me sinto insegura".
Para Lara, o facto de o companheiro encontrar outras pessoas com quem se sente bem a partilhar a sua intimidade é motivo de alegria. "Sinto prazer ao ver que as pessoas de quem gosto estão bem", garante. "Escolho todos os dias estar com Jorge tendo a liberdade de saber o que é amar outras pessoas. E com ele passa-se a mesma coisa. Dá-me mais confiança saber que ele, tendo a liberdade de estar com outras pessoas, escolhe todos os dias estar comigo. "O resultado é uma relação mais sólida, profunda e verdadeira, asseguram.